Um antibiótico produzido a partir de amostras da bactéria Paenibacillus Elgii Ourofinensis pode tratar a Salmonelose Aviária, com foco nas bactérias Salmonella Gallinarum (Tifo Aviário) e Salmonella Pullorum (Pulorose).
A solução encontrada por um grupo de pesquisadores da Universidade Católica de Brasília (UCB) em parceria com a Ouro Fino, empresa de Saúde Animal tem foco nas bactérias Salmonella Gallinarum (Tifo Aviário) e Salmonella Pullorum (Pulorose), responsáveis por severas perdas na avicultura, e Salmonella Enteritidis que causa contaminação alimentar em todo o mundo.
Pesquisas realizadas pelo projeto de Metagenômica e Microbiota do Cerrado, do Programa de pós-graduação em Ciências Genômicas e Biotecnologia da UCB, identificaram que a bactéria Paenibacillus, presente no solo do Cerrado, produz um peptídeo natural e biodegradável eficaz no combate à bactéria Salmonella sem causar danos à saúde do animal e sem deixar resíduos na carne.
Licenciamento
No dia 19 de novembro, às 15h, autoridades e cientistas vão prestigiar, na sede da Universidade, em Brasília (DF), a cerimônia de assinatura do Contrato de Licenciamento de Tecnologia, firmado entre a UCB e a Empresa Ouro Fino, que permitirá a comercialização do produto em larga escala. Após a licença, a estimativa é que em dois anos, o medicamento estará disponível para venda ao setor de Avicultura. A comercialização da carne livre de contaminação e resíduos, tratada à base do novo medicamento, vai beneficiar aproximadamente 180 milhões de brasileiros que somam um consumo de 70% da produção anual (45 kg por pessoa ao ano).
Vilões
Ao contrário do que a maior parte dos consumidores imagina, os maiores vilões de carnes e frangos não são os hormônios, mas os antibióticos que podem contribuir para o surgimento de bactérias e outros micro-organismos cada vez mais resistentes a remédios. Entre os benefícios, a população terá acesso a uma carne mais saudável, com melhor qualidade e de baixo custo, já que a fórmula é feita a base de amostras do próprio solo. Isso porque a Salmonella causa diarreia e perda de peso nas aves contaminadas, o que causa prejuízo na produção em larga escala.
Pesquisa e desenvolvimento
Após a descoberta, a Universidade Católica de Brasília e a Ouro Fino solicitaram a patente em território nacional (2009) e internacional (2011), na Austrália, China, Colômbia, Coreia do Norte, Coreia do Sul, Índia, Japão, México, Nova Zelândia, Rússia, Estados Unidos e Europa, pois não havia registro da bactéria. Responsável pela realização dos processos de registros de patentes e de propriedade intelectual na UCB, a Agência de Inovação e Empreendedorismo EixO tornou possível a exclusividade da descoberta. “Único no mundo, o estudo conseguiu levar a instituição para um patamar elevado. Apenas grupos seletos conseguiram colocar um produto no mercado. Nós demos todo o apoio jurídico aos pesquisadores e viabilizamos o pedido de transferência de tecnologia”, explicou a Gerente Executiva da Agência EixO, Neila Farias Lopes.
Investimento
A UCB firmou parceria com a empresa brasileira Ouro Fino com o objetivo de levar o conhecimento da universidade para a empresa desenvolver e comercializar a fórmula do medicamento. Em troca, a Universidade receberá os royalties pela comercialização do medicamento no mercado. Cerca de 800 mil reais foram investidos pela empresa Ouro Fino, por meio de bolsas de Doutorado e de Iniciação científica, nos laboratórios de pesquisa da instituição para desenvolver a tecnologia antimicrobiana de tratamento dos frangos. Com o projeto financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi possível a aquisição de fermentadores de grande porte para o cultivo da bactéria em altos volumes. Desta forma, o antibiótico foi produzido em grande quantidade para os testes de campo que indicaram a diminuição da contaminação das aves.
Inicialmente, as pesquisas foram coordenadas pelo professor doutor Ricardo Henrique Kruger, na época à frente do projeto no Programa de pós-graduação em Ciências Genômicas e Biotecnologia. Durante os estudos, ele contou que a intenção era a busca de informações genéticas por metagenômica, uma técnica de Biologia Molecular, e de cultivo microbiano (de bactérias) clássico para a obtenção de moléculas com potencial de uso na saúde animal.
Kruger explicou ainda que, em colaboração com outros pesquisadores e estudantes, utilizou duas técnicas: “A primeira foi a metagenômica para obtenção de informação genética diretamente de amostras ambientais, aquelas sem cultivo em laboratório, e a segunda buscando o isolamento e caracterização de isolados microbianos da mesma amostra ambiental, mas com cultivo em laboratório. E foi desta segunda abordagem que foi identificada tanto a bactéria produtora do antibiótico quanto a natureza química desta molécula”. Atualmente, Kruger é docente da Universidade de Brasília (UnB).
Segundo o pesquisador Ricardo Kruger, o problema principal para a criação de frango é a contaminação que apresenta alto índice. “Os testes foram feitos em ambiente totalmente controlado. Então, utilizamos o método de dispersão para associar e quantificar valores. Além disso, a partir dos testes in vitro, introduzimos o antibiótico junto à Salmonella para verificar a evolução. No teste in vivo, o antibiótico é diluído no alimento que o animal ingere e, depois, verificamos o nível de contaminação presente, além de aspectos do crescimento do animal”.
Octavio Luiz Franco, líder da pesquisa na área de Análises Proteômicas e Genômicas do Programa de pós-graduação da UCB, explica que o material genético recuperado diretamente de amostras ambientais foi utilizado para a fabricação do remédio. “Os antibióticos vêm de bactérias do solo que os usam pra controlar outras bactérias e dominar o ambiente. Utilizamos o solo apenas como matéria-prima para a produção do medicamento, pois elas podem ser desenvolvidas em fermentadores. Por isso são eficazes e não tem efeito colateral para a saúde do animal e, consequentemente, para nós”.
Ao longo de 10 anos, o coordenador do Programa de pós-graduação em Ciências Genômicas e Biotecnologia da UCB, Rinaldo Wellerson Pereira, acredita que a experiência de sucesso encerrou um ciclo no processo de produção de conhecimento, que teve início no programa de Mestrado e chegará ao mercado para beneficiar os consumidores. “O licenciamento desta tecnologia é um momento muito importante para todos que estiveram envolvidos direta ou indiretamente no projeto. A parceria com a empresa Ouro Fino fez com que nossas ideias se tornassem realidade”, disse.
Segundo Octavio Franco, a descoberta da bactéria representa um marco na carreira. “No Brasil, é extremamente difícil levar um produto ao mercado. Ao unir a comunidade acadêmica com a indústria é possível resolver problemas relevantes para a sociedade. E o licenciamento do medicamento é uma prova disso”, concluiu.