Para alcançar a qualidade no ensino de Medicina, os estudantes deveriam sair da faculdade e realizar o Revalida. A opinião é do presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Florentino Cardoso, convidado de segunda-feira (10) do programa Roda Viva, apresentado ao vivo na TV Cultura e reproduzido pelo UOL. Atualmente, o exame só é aplicado aos médicos formados no exterior que desejam trabalhar no país.
Segundo Cardoso, o exame ajudaria a filtrar os médicos formados no Brasil, já que eles vão lidar com a saúde da população. “É preciso ter uma boa quantidade de médicos, mas de boa qualidade, é isso que a gente quer”, defende Cardoso.
Na opinião do presidente da AMB, o governo tem um papel decisivo para melhorar a qualidade do ensino nas faculdades, não só com um exame, mas também com uma avaliação criteriosa das faculdades. “O Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) avalia as faculdades com base no desempenho dos estudantes, corpo docente, estrutura e outros itens, mas não acontece nada com que tem uma nota ruim”, aponta. O cirurgião geral e oncologista sugere, ainda, que a grade curricular seja direcionada à necessidade do povo brasileiro.
Questionado sobre a pouca procura dos estudantes pela residência em Saúde da Família, Cardoso avalia que é possível convencer os recém-formados a ir para essa área com a valorização desses profissionais. Ele explica que muitos médicos que vão para os rincões brasileiros não conseguem um emprego formal, ganham pouco – quando não recebem o salário atrasado e sofrem com as poucas condições de trabalho. O presidente da AMB avalia que se os médicos tivessem carreira pública, como os profissionais do Judiciário, os profissionais se fixariam nessas regiões, pois teriam garantias e também poderiam ser realocados no futuro.
Mais Médicos
O presidente da AMB fez duras críticas ao programa Mais Médicos, criado pelo governo federal em julho de 2013 para levar profissionais da saúde em cidades que sofriam com a falta de médicos. Em um balanço para avaliar o programa, Cardoso afirma que um dos principais problemas é o desrespeito às leis brasileiras, tanto pela falta da revalidação do diploma quanto na contratação de médicos cubanos que recebem menos do que os outros participantes.
“Nós defendemos a saúde de qualidade. Os médicos chegam aqui para trabalhar e nós não sabemos se eles são médicos, se tem conhecimentos, habilidades e atitudes que a profissão requer. Assim, o governo expõe a população”, expõe o ginecologista e oncologista, que afirmou que não iria se opor ao programa se todos os médicos inscritos fizessem a prova do Revalida.
A AMB foi a entidade que apoiou e empregou a médica cubana Ramona Matos Rodrigues, que deixou o programa Mais Médicos e pediu asilo ao Brasil. A associação a contratou para atuar como assessora administrativa da diretoria, em Brasília, com salário de R$ 3 mil. O órgão também criou, após o episódio, um programa para dar apoio a estrangeiros que estiverem insatisfeitos ou quiserem abandonar o programa do governo federal.
“Ficamos preocupados com o relato da Ramona. Ela só soube o valor que iria ganhar no Brasil (600 dólares depositados em uma conta em Cuba e 400 dólares para ficar no país) dois dias antes de vir para cá. Ela só descobriu que outros profissionais ganhavam mais quando chegou aqui. Não podemos compactuar com isso”, alerta Cardoso.
Ele também questionou a falta de direitos dos médicos cubanos no país. “As leis cubanas estão valendo no território brasileiro, pois eles têm a liberdade cerceada. Precisam ir do trabalho para a casa e não podem viajar pelo Brasil como os outros profissionais do programa”, aponta o ginecologista e oncologista.
Atendimento no SUS
Mesmo com os problemas do SUS (Sistema Único de Saúde), o presidente da AMB conseguiu listar os pontos positivos do sistema, dentre eles a universalidade, já que todos os brasileiros podem ser atendidos. “O programa de vacinação é um exemplo para o mundo, o programa de atenção para quem é HIV positivo também e o sistema de transplante de órgãos e tecidos tem a maioria dos procedimentos realizados no SUS”, afirma.
Mas para denunciar as grandes filas para consultas simples, doentes desassistidos e outros problemas de infraestrutura, a AMB pretende lançar a “Caixa Preta”. No projeto, os próprios usuários da rede pública de saúde poderão relatar sobre o seu atendimento nos postos de saúde, policlínicas e UPAs (Unidades de Pronto Atendimento). “Eles podem filmar, contar o que aconteceu, queremos verdades sobre o que ocorre na saúde brasileira”, completou.
A ideia da associação é mostrar que os próprios usuários estão reclamando e incomodados com a situação. “A AMB não tem partido e nós abominamos a corrupção. Queremos uma boa saúde para todos e precisamos mostrar a realidade dos locais que fazem isso de forma adequada e os que não fazem”, afirmou.
Participaram da bancada Cláudia Collucci, repórter da Folha de S. Paulo; Cristiane Segatto, repórter da revista Época e colunista de saúde da Época Online; Martim de Almeida Sampaio, advogado e diretor da comissão de direitos humanos da OAB de São Paulo; Claudio Lottenberg, médico oftalmologista e presidente do hospital israelita Albert Einstein; e David Oliveira de Souza, médico e professor do instituto de ensino e pesquisa do hospital Sírio Libanês foi também diretor médico da organização Médicos Sem Fronteiras no Brasil. O Roda Viva ainda conta com a participação do cartunista Paulo Caruso.
Fonte: UOL